
Entre formatinhos, Salvats, encadernados e autorais, li um total de 26 quadrinhos no ano passado. Separei aqui os que mais gostei, de novo em uma ordem mais ou menos cronológica de leituras do que de afeto.

Perramus foi uma BAITA surpresa, porque era um quadrinho que eu tinha há ANOS, daqueles garimpos em saldão de livros a dez reais em alguma Bienal da vida. Sem poder investir em novos quadrinhos e livros, chega o momento da tomada de vergonha na cara e de a gente usufruir de tudo aquilo que conquistou. Perramus é um quadrinho argentino e pouquíssimo convencional em termos estéticos, por utilizar algo que imagino que seja aquarela em preto e branco.
Além disso foi lançado por um selo da Globo, por volta de 2010 e produzido/publicado originalmente em meados pro final dos anos 80. A editora não é lá muito conhecida por seu catálogo de quadrinhos e este é tipo o último volume de uma série, aparentemente. Os motivos que levaram à publicação por aqui são um mistério para mim. De qualquer forma que bom que chegou até nós e que meu faro para boas oportunidades de investimento não me traiu. O material é muito bom, já o mercado editorial, seus ciclos e encalhes, francamente.
A história acompanha o detetive Perramus e seu grupo de amigos em busca dos dentes do cantor Carlos Gardel que foram roubados de sua ossada e estão espalhados pelo mundo. É uma viagem deliciosa, com momentos criativos, divertidos e cheia de referências literárias de Gabriel García Marquez e Borges. Achei francamente genial. O quadrinho me levou a uma busca por livros do autor argentino Roberto Fontanarrosa que se revelou um tanto frustrada, mas isso é outra história.

De 2019 para cá tenho tentado fazer o movimento de aumentar o número de quadrinhos autorais nas minhas listas e pilhas. Esse do Crumb foi mais um que garimpei em Bienais e que também fazia tempo que estava aqui até que chegou sua hora e vez. Fiz uns poucos tuites para marcar como eu estava impressionado com a leitura em meados de abril do ano passado. Um machismo aqui, outro acolá, há sinceridade e bom manuseio das narrativas meio autobiográficas. Gostei muito das tirinhas que ele fez com Aline, sua esposa, e sobre a relação deles. Eu já tinha lido o Genesis dele. Fico com vontade constante de ler mais coisas. E assistir Fritz, the Cat.

Estou em alguns grupos de quadrinhos no Facebook e Bulldogma sempre figurou na lista de melhores nas mais diversas postagens. Este reconhecimento do público leitor é pra lá de merecido. Acho que ao lado das publicações do Marcelo Quintanilha e do Marcelo D’ Salete, Bulldogma expõe a força e fôlego da boa qualidade do quadrinho nacional apesar das dificuldades que é viver de arte no Brasil, sobretudo com um lixo na presidência e em tempos necropolíticos em que não há amor ou reconhecimento por produções brasileiras reais e sim uma ficção delirante e distorcida de nacionalismo xenofóbico e cafona.
Bulldogma acompanha um período da vida de uma ilustradora freelancer que se muda para um bairro onde coisas estranhas acontecem – praticamente abduções e coisas alienígenas. O babado é que São Paulo, esta cidade que a gente ama odiar e ama amar, e com a qual a gente se relaciona muito, é cenário constante. Há muitas referências, não só da cultura pop, como da vida urbana. Ler esse quadrinho em ano que não pude gastar sola de sapato andando por aí foi uma maneira de estar na rua, mesmo não estando.

Vou dar um truque aqui e economizar as palavras, já que esse quadrinho é composto basicamente de imagens. Das coisas mais lindas que li no ano.

Há muitos e muitos anos que eu queria ler Persépolis e há quase meia década eu ganhei ele de presente. Ficou todo esse tempo indefinidamente aguardando sua vez, até que enfim chegou o seu momento. Eu AMEI Persépolis de muitas maneiras e também temi e sofri muito com toda a ascensão do conservadorismo e do que parece ser uma teocracia se formando no Brasil. O Irã é aqui, torço e luto para que não. Falta agora ver o filme.

Sou muito fã dos quadrinhos que o Rafa Bastos posta em suas contas no Twitter e no Instagram. Representar sexualidade sem tabus, de maneira despudorada é uma super fonte de inspiração. Pena que é curtinho.

Outro quadrinho garimpado e que demorei demais pra ler. Palestina é um ótimo quadrinho, do Joe Sacco, de uma época em que a Ilustrada era mais hypada e os quadrinhos dele eram mais reverenciados. É incrível como passado tanto tempo de sua produção e publicação continue sendo um tema atual. Me fez repensar muitas coisas sobre a experiência do cárcere.
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